Erosão costeira e o desaparecimento de terras: O futuro das ilhas do Pacífico
Os debates sobre as mudanças climáticas estão cada vez mais presentes nas reuniões entre os países, nas universidades, nas empresas e até mesmo no dia a dia de cada professor do Ensino Fundamental e Médio.
Uma das questões levantadas nos últimos anos é a complicada situação dos Estados¹ insulares que podem desaparecer no futuro devido ao aumento do nível dos oceanos gerado pelo aquecimento global. De acordo com relatório da Unesco “State of the Ocean 2024” elaborado com o apoio da Islândia, os oceanos estão aquecendo a uma taxa duas vezes maior do que há vinte anos.
Considerando esse contexto, já é possível ver o avanço do mar em diversas regiões litorâneas, esse processo é denominado erosão costeira e causa sérias consequências para a populações locais, tornando-se uma ameaça existencial e forçando comunidades inteiras a enfrentar a perda de suas casas, terras e culturas.
A erosão costeira é um fenômeno natural, mas que está se intensificando devido às ações antrópicas, levando ao desaparecimento de faixas de areia das praias em ritmo alarmante. Esse processo tem acontecido em várias partes do mundo, mas neste artigo vamos focar em explicar sobre a erosão costeira e o que tem acontecido nas ilhas do Pacífico.
O que é a erosão costeira?
A erosão costeira é o processo de desgaste e remoção de sedimentos ao longo da linha costeira devido à ação das ondas, correntes e ventos. Embora seja um fenômeno natural, fatores humanos têm acelerado esse processo, tais como:
- Construções irregulares e remoção de vegetação costeira;
- Expansão da urbanização;
- Emissão de gases de efeito estufa;
- Exploração excessiva de areia para construção;
- Turismo desordenado;
- Prática de pesca destrutiva (uso de explosivos);
- Desmatamento;
- Modificação de cursos de água;
- Despejo de esgotos e resíduos industriais nos oceanos.
Perceba que essas ações afetam a biodiversidade e a dinâmica natural das correntes marítimas (porções de água que se deslocam pelo oceano) e da sedimentação (deposição de partículas sólidas), além de eliminar barreiras naturais que estabilizam os solos e reduzem a força das marés. Somando-se a isso, a emissão de gases estufa, causa o aquecimento das águas e, consequentemente, o derretimento das geleiras. Acontece, assim, o avanço das águas em direção ao continente.
Ameaça às ilhas do Pacífico
As ilhas do Pacífico, como Kiribati, Tuvalu e Ilhas Marshall, estão entre as mais vulneráveis à erosão costeira devido às baixas altitudes (em média entre 1m e 3m). Com a elevação do nível do mar, atóis (formações geológicas compostas principalmente por recifes de coral que formam um anel ou uma estrutura circular ao redor de uma lagoa central) estão sendo engolidos pelo oceano, reduzindo terras habitáveis e comprometendo fontes de água doce. Diante disso, podemos entender que as populações locais enfrentam enormes desafios, dentre eles:
- Perda de terras agricultáveis e escassez de alimentos;
- Salinização de reservas de água potável;
- Deslocamento forçado de comunidades inteiras;
- Crise econômica e dependência de ajuda externa.
Consequências ambientais e sociais
Como dito anteriormente, os impactos da erosão costeira vão além das mudanças geográficas, afetando a biodiversidade e a sobrevivência das populações. Muitos indivíduos migram para outros países buscando refúgio antes que suas terras se tornem inabitáveis, são os refugiados climáticos. Além disso, a pesca e o turismo, principais fontes de renda, são prejudicados pela degradação ambiental. Sendo assim, quem opta por ir para outro país antes que o pior aconteça, enfrenta as dificuldades de recomeçar em um local e cultura diferentes do seu país de origem e sem saber se conseguirão casa e trabalho. Enquanto que os que ficam, enfrentam a perda de suas moradias e dificuldades financeiras, já que muitos dependem da biodiversidade para gerar suas rendas.
Estratégias e soluções possíveis
Diante desse cenário preocupante, diversas estratégias podem ser implementadas para mitigar os efeitos da erosão costeira. Lembrando que, além de soluções locais, é necessário pensar no global. A seguir estão relacionadas algumas dessas estratégias.
Soluções baseadas na natureza
As abordagens baseadas na conservação e restauração de ecossistemas naturais são altamente eficazes e sustentáveis:
- Restauração e proteção dos recifes: Os recifes de coral servem como barreiras naturais contra a energia das ondas, diminuindo o avanço do mar em direção ao continente.
- Conservação dos manguezais e vegetação costeira: manguezais, ervas marinhas e dunas estabilizadas com vegetação nativa auxiliam na retenção de sedimentos e na dissipação da energia das ondas.
- Reforço de areias: A reposição de areia em praias ameaçadas pode restaurar habitats e mitigar a erosão temporariamente.
Infraestrutura e engenharia costeira
Em algumas situações, soluções estruturais podem ser necessárias para conter a erosão:
- Quebra-mares e recifes artificiais: estruturas submersas que reduzem a energia das ondas antes de atingirem a linha costeira.
- Obras de contenção: barreiras físicas construídas ao longo da costa para proteger a terra contra a erosão. No entanto, essa medida é emergencial e apenas diminui momentaneamente os efeitos da erosão costeira.
- Planejamento urbano: construção de infraestrutura longe das áreas mais vulneráveis para minimizar os danos. O planejamento urbano é fundamental. No entanto, governos de diversas regiões encontram dificuldades diante de processos de urbanização que aconteceram de maneira desordenada e que agora precisam de uma reestruturação que demanda altos investimentos.
Políticas e gestão integrada da zona costeira
A implementação de políticas eficazes pode garantir a sustentabilidade das regiões costeiras a longo prazo:
- Regulamentação do uso do solo: proibir construções em áreas de alto risco e incentivar o planejamento adequado do desenvolvimento urbano.
- Educação e conscientização: engajar comunidades locais para promover práticas sustentáveis e aumentar a resiliência das populações.
- Monitoramento e pesquisa: investir em estudos sobre mudanças costeiras para embasar a tomada de decisão com base em evidências científicas.
Cooperação Internacional
- Acordos internacionais: iniciativas globais, como o Acordo de Paris, buscam reduzir emissões de gases de efeito estufa e conter o avanço do nível do mar. A União Europeia e 193 países fazem parte do Acordo de Paris que estabeleceu como meta manter o aumento da temperatura global abaixo de 2ºC acima do nível pré-industrial. A cooperação internacional é essencial, pois as ações locais somadas podem contribuir para afetar todo o planeta.
O futuro das ilhas do Pacífico
As previsões indicam que, sem intervenções eficazes, algumas ilhas do Pacífico podem desaparecer nas próximas décadas. Algumas alternativas consideradas incluem:
- Migração planejada: realocação de comunidades inteiras para outros países.
- Tecnologias inovadoras: construção de ilhas artificiais e adaptação urbana resiliente.
- Educação e conscientização global: incentivo a práticas sustentáveis e pressão por políticas ambientais mais rigorosas.
No entanto, essas alternativas não são fáceis de serem implementadas. Alguns desafios podem aparecer ao longo desse caminho.
A realocação de comunidades inteiras para outros países depende da compra de terras e da abertura desses Estados para receberem os imigrantes. Pensando na nova realidade desses indivíduos, moradias precisaram ser construídas, postos de trabalho deverão ser criados. Além disso, a cultura, a história e a identidade desses povos que há séculos habitam as ilhas do Pacífico também estão em jogo.
Como um exemplo desse tipo de alternativa temos Kiribati que em 2014 comprou terras em Fiji pensando em uma possível realocação de parte da sua população.
Já a construção de ilhas artificiais exigem alto investimento financeiro, o que pode demandar ajuda externa.
Sobre a educação e conscientização global, há um debate entre os países, pois alguns acreditam que adotar práticas mais sustentáveis poderia barrar o desenvolvimento econômico. No entanto, países que investem em sustentabilidade podem aumentar sua lucratividade de diversas maneiras, incluindo a redução de custos, a atração de investimentos e a conquista de mercados internacionais. Veja alguns exemplos a seguir:
- Redução de custos operacionais
Empresas e governos que adotam práticas sustentáveis, como eficiência energética, redução de desperdícios e reciclagem, conseguem diminuir gastos com matéria-prima e energia. A transição para fontes renováveis, por exemplo, reduz a dependência de combustíveis fósseis, tornando a economia mais resiliente a crises energéticas e flutuações de preços.
- Atração de investimentos internacionais
Investidores ao redor do mundo estão cada vez mais preocupados com critérios ESG (ambientais, sociais e de governança). Países que demonstram compromisso com a sustentabilidade atraem mais investimentos estrangeiros e fundos que priorizam negócios responsáveis, aumentando o fluxo de capital e a geração de empregos. Isso acontece porque grande parte dos consumidores se preocupam em comprar produtos e serviços de empresas que adotam práticas sustentáveis.
- Exportação para mercados exigentes
Muitos países, principalmente na União Europeia, impõem restrições ambientais rigorosas sobre produtos importados. Empresas que adotam processos produtivos sustentáveis podem exportar com mais facilidade, ampliando sua participação no comércio global.
- Desenvolvimento de novos setores econômicos
A sustentabilidade impulsiona o crescimento de setores como energia renovável, biotecnologia e economia circular. Esses setores geram empregos, aumentam a arrecadação de impostos e reduzem a dependência de modelos econômicos ultrapassados e poluentes.
- Melhoria da imagem e do turismo
Países sustentáveis conquistam uma imagem positiva no cenário global, atraindo mais turistas, empresas e talentos. O ecoturismo, por exemplo, pode se tornar uma fonte lucrativa de receitas, aproveitando as riquezas naturais de maneira responsável.
Dessa forma, a sustentabilidade não é um obstáculo ao crescimento econômico; pelo contrário, ela é uma alavanca para a prosperidade. Países que investem em práticas sustentáveis criam um ambiente mais competitivo, inovador e resiliente, garantindo lucro a longo prazo e um futuro melhor para as próximas gerações.
Conclusão
A erosão costeira representa uma ameaça séria às ilhas do Pacífico, pondo em risco populações inteiras e ecossistemas essenciais. Para combater esse problema, é fundamental uma abordagem integrada envolvendo soluções tecnológicas, medidas naturais e ações políticas globais. O futuro dessas comunidades depende da conscientização e do comprometimento de governos e indivíduos para reduzir os impactos das mudanças climáticas e proteger as áreas costeiras.
¹ O Estado é composto por um povo que possui um território e um governo soberano.